terça-feira, abril 18, 2006

3º (TERCEIRO)

Era apenas um rapaz solteiro que aos 35 anos ainda morava com a mãe.
A velha era muito religiosa e por isso ele teve uma educação bastante rígida quando criança. Se tirasse nota baixa sofria castigo; se tirasse nota alta, recebia um "não fez mais que sua obrigação" como prêmio. Ela nunca elogiou ou o incentivou a fazer qualquer coisa que fosse. Ao contrário, sempre cobrava mais e mais da pobre criança. Nunca ia a festas ou a dias especiais na escola, daqueles em que os pais orgulhosos acompanham os filhos. Nada que ele fizesse era bom ou bonito o bastante. Nunca comprou um presente de Natal ou de aniversário para ele.
Ele nunca ganhou brinquedo de dia das crianças nem docinhos de Cosme e Damião. Nunca empinou pipa, rodou pião, jogou bola. Nunca tivera um amiguinho da escola à mesa de jantar, nunca ouviu uma canção de ninar ou uma historinha de conto de fadas. Ela dizia que isso tudo era coisa de criança mimada, que homens de verdade só tinham tempo para o trabalho e para os estudos. Dizia que ele seria melhor que todos os outros da família, que seria Doutor.
Aos 10 anos levantava-se bem cedo para ir à escola, mas não sem antes preparar o café de sua mãe. Quando voltava, uma pilha de louças sujas estava a sua espera, assim como também um banheiro imundo para limpar, uma pilha de roupas para passar, a casa toda para espanar e varrer. Sua mãe se encarregava apenas de preparar a comida e de orar pela alma dos dois. Ela não trabalhava, já que recebia a pensão do finado marido, e por isso passava o dia todo rezando em seu quarto, pedindo a Deus que melhorasse sua vida.
E assim Mauro cresceu. Trabalhou, estudou e formou-se Engenheiro. Trabalhava atualmente numa ótima empresa do ramo e aos 35 anos ainda morava com a velha.
A amargura de sua mãe cresceu depois que ela se tornou paralítica. E Mauro se viu no dever moral de abdicar de sua vida para ajudar a pobre mãe doente. Afinal, ele era uma parte dela. Só saia de casa para ir ao trabalho. Não bebia, não fumava, não trepava. Não tinha nenhum tipo de vida social ou contato com outras pessoas fora do ambiente de trabalho, a não ser nas noites de quinta.
Nos últimos 2 anos, todas as quintas-feiras Mauro saia batia seu cartão pontualmente às 18 h00 e só chegava em casa depois das 2 da manhã. Dizia que ia à igreja assistir a missa e depois ajudava o padre com alguns afazeres da paróquia. Nesses dias quando chegava tarde da noite, entrava no quarto da mãe adormecida, dava-lhe um beijo na testa e ia dormir com um sorriso de satisfação nos lábios, estranhamente emoldurado naquele rosto habitualmente melancólico.
...
Ele chegou minutos após Fraulein Ulla abrir a casa. Sentou-se em um canto escuro do bar e pediu um conhaque. Ficou olhando em volta como se fizesse o reconhecimento do campo de caça. Ali ele era predador e, como tal, farejou de longe o perfume de Tereza, que acabara de descer para tomar a primeira dose da noite.
Ela tinha o hábito de tomar um conhaque antes de qualquer coisa. Dizia que amaciava a voz e esquentava a xana. Sentou-se bem ao lado dele, mas não lhe dirigiu a palavra. Ficou imaginando qual era a tara daquele infeliz que, apesar de bem vestido, exalava colônia masculina de terceira sobre um leve cheiro de mofo um tanto familiar.
Tereza cresceu em uma das muitas favelas de sua cidade, como muitas outras de sua família, de tantas famílias que existem por aí. Não foi à escola, não sabe ler direito. Mal sabe assinar o próprio nome. Sendo assim, a única ocupação que poderia ter escolhido seria a laboriosa vida de meretriz.
Saiu de sua casa aos 14 anos e logo foi acolhida na casa de Fraulein Ulla, uma alemã de traços fortes, natural de Colônia, que vivia no Brasil há algum tempo.
Tereza já era calejada na profissão. Já tinha apanhado, já tinha batido. Já foi médica, enfermeira, professora, babá, mãe, irmã, dominatrix. Participava das mais bizarras e escatológicas fantasias sem pudor algum, sem peso na consciência. E por isso ela era muito procurada.

- Quer apanhar, eu bato! Quer tomar mijo, quer comer merda, quer ser tratado como um cachorro sarnento, quer ser meu filho, meu pai, meu irmão, meu aluno? É só pagar por isso!!! Pagando bem, que mal tem? - dizia sempre Tereza ao ser questionada por suas colegas de profissão.

Ele aspirou o odor forte de água de colônia como se farejasse sangue fresco e se interessou imediatamente pela mulher ao seu lado. Olhou para ela como o lobo olha para o cordeiro e percebeu que ela tinha quadris largos e seios fartos, exatamente do jeito que ele gostava. Pediu um outro conhaque e logo tratou de puxar papo com ela, dizendo ao barman que as bebidas dela eram por sua conta.
Tereza agradeceu do modo mais lacivo que aquele bordel já tinha visto e foi logo tratando de negócios. Disse que queria 120 dinheiros por uma hora e ele perguntou quanto custaria para ela passar a noite com ele.

- Gatinho, eu não costumo fazer isso, mas como hoje estou cansada seria legal ter um cliente só. São 1500 dinheiros pela noite toda e você tem que pagar metade agora.

Ele nem titubeou. Sacou a carteira de couro negro, tirou 2 notas de 500 e entregou para Tereza. Ela pediu para que ele esperasse 10 minutos enquanto mudava de roupa, mas ele disse que queria ela daquele jeito mesmo, que não precisava trocar roupa nenhuma. Então ela pegou a bolsa e os dois saíram.
Em 5 minutos chegaram ao carro. Ele dirigiu até uma casa grande e bonita, um sobrado na zona sul. Desceu do carro e, como um bom cavalheiro, abriu a porta para ela descer também. Entraram na casa e sentaram-se no sofá. Ele lhe preparou uma dose de scotch com 3 pedras de gelo, mas ela disse que queria cowboy. Ele caprichou na dose, entregou o copo e sentou-se próximo a ela. Tereza deu um gole farto e engoliu metade do conteúdo do copo, sentindo sua garganta queimar ao mesmo tempo que um gosto docemente amadeirado invadia sua boca, um gosto bom que só quem aprecia uma boa bebida sabe como é.
Ele sorriu.
Tereza sentiu uma leve tontura e imaginou que estava bebendo muito rápido. Colocou seu copo no chão, recostou-se no sofá de couro branco e perguntou ao seu anfitrião qual seria seu nome.

- Pode me chamar de Dor.

Tereza não entendeu bem o que acabara de ouvir, mas percebeu que havia algo de errado. Seus olhos ficaram embaçados, sua boca secou. Ouvia um zumbido caótico em sua cabeça e não conseguia ordenar seus pensamentos. Juntou todas as forças de seu corpo para se levantar, mas só conseguiu enterrar seu nariz no assoalho.
...
Ela abriu os olhos lentamente, sentindo o incômodo da luz queimando suas pupilas e percebeu aos poucos que não estava mais na sala bem arrumada para onde tinha ido com seu cliente, mas sim em um cômodo fétido onde só havia um ponto de luz apontando para sua cara. Seus olhos latejavam, assim como sua cabeça. Percebeu que estava amarrada a uma cadeira velha de madeira com as mãos atadas às costas e com os pés colados às pernas da cadeira por fita adesiva. Tentou gritar, mas sua boca estava cheia de algodão, que abafava seu desespero. Pensou em várias coisas ao mesmo tempo, tentando entender porque estava ali. Não sabia exatamente há quanto tempo estava amarrada ou onde estaria seu cliente e começou a chorar compulsivamente, sentindo que a morte estava próxima. Imaginou o que aquele doente poderia fazer com ela e quis morrer naquele instante. Lembrou-se de várias histórias sobre estupradores de prostitutas e de como eles agiam, abusando de suas vítimas com crueldade nazista e raramente deixando-as vivas. Lutou desesperadamente para se livrar de sua prisão de madeira, mas nada conseguiu. Apesar de velha, a cadeira era feita de uma madeira forte e nada que Tereza pudesse fazer iria libertá-la.
Cansada de lutar em vão, Tereza deixou-se abater. Sentiu de súbito uma calma invadir seu coração, a calma mórbida que acompanha os condenados até o patíbulo, a mão do diabo no ombro do assassino. Tomada por essa calma, decidiu que iria pensar no que fazer ao invés de se debater como uma mosca num prato de sopa quente e começou a olhar em sua volta, percebendo que estava em uma espécie de porão, um lugar totalmente imerso em escuridão, salvo onde estava amarrada. Nada conseguia ver além daquele ponto, apenas o assoalho de madeira empoeirado. De súbito, uma porta se abre atrás de Tereza e por ela passa seu algoz sustentando no rosto um sorriso perverso. Eles sabem que naquele momento ele é Deus; ele decide se, onde, quando, como e por que Tereza deve morrer. Ele tem o poder de dar e tirar a vida e quer ser adorado como tal. Ele não permite que ela o veja, ficando apenas a acariciá-la por trás e sussurrando em seu ouvido.

- Não lute, porque você nunca conseguirá sair dessas amarras. Ninguém nunca consegue. Uma das poucas coisas que aprendi com minha mãe foi dar um nó de marinheiro. Eu vou retirar o algodão de sua boca, mas ordeno que você fique calada. Se você gritar irei esmagar os dedos de seus pés, um por vez, para que você seja punida pela desobediência.

Assim dizendo, ele aperta a mandíbula de Tereza, forçando-a a abrir a boca até que seus dedos caibam dentro para depois arrancar o chumaço de algodão que a calava. Tereza, como num impulso instintivo de sobrevivência, começa a gritar e a se debater, inquirindo o nome daquele que se tornara seu mestre. Ele, por sua vez, cala Tereza com um soco em sua boca, vai até uma mesa e se arma com uma espécie de martelo. Chega perto dela, mostra a ela a ferramenta e diz:

- Eu ordenei que não gritasse. Quem você pensa que é para se dirigir a mim, seu Deus, aos gritos?

Ele se senta junto à moça, fitando aqueles pés bem feitos e bem cuidados, e percebe que as unhas estão pintadas com muito capricho. Isso faz com que recorde dos pés de sua mãe, que com muito cuidado lavava todos os dias antes de se deitar. Lembra-se também que por várias vezes tinha sido forçado a lamber esses mesmos pés, minutos depois de ser atingido com chutes na boca. Lembra-se de sentir o gosto de sangue misturado com o esmalte e de engolir vários dentes. Repentinamente, ergue o martelo e bate com toda a sua força no chão, milímetros distante dos dedos de Tereza. Ela grita de pavor, sem se dar conta de que nada a atingiu.

- Eu sou um Deus misericordioso, contudo não convém me desobedecer novamente. Cale-se e somente grite quando eu assim ordenar. Fique calada enquanto vou pegar um presente para você.

Tereza ainda está congelada de pavor, mas entende que deve obedecer. Juntando todas as suas forças, engole o choro e novamente tenta se concentrar nos detalhes do lugar onde está. Seu mestre havia saído e deixara a porta aberta, fazendo com que mais luz entrasse naquele lugar que antes era só escuridão. Percebe que naquela espécie de porão há várias prateleiras com as mais diversas ferramentas: alicates, martelos, chaves, brocas, serras, etc, e também um grande armário embutido no fundo da sala trancado com uma grossa corrente presa por um cadeado. Ela vê também que no teto existem vários ganchos como os usados em um açougue para pendurar as peças de carne já retalhadas e que alguns desses ganchos ainda estão sujos de sangue coagulado. Tendo essas imagens em mente, Tereza começa a imaginar seu destino. Seria degolada e sangraria até a morte como uma novilha em oferenda a seu Deus, que provavelmente depois iria esquartejá-la cuidadosamente utilizando suas serras e alicates.
Tereza ainda tentava saber onde estava quando ele voltou. Notou que ele estava com uma coroa de louros em uma das mãos e também uma sacola plástica cheia de pétalas de rosas vermelhas. Um vidro de água de cheiro também o acompanhava, exalando um doce perfume que contrastava com a imagem fétida daquele lugar. Ele a olhou no fundo da alma e ela sentiu seu corpo todo vibrar de agonia, pois sabia em seu íntimo quais eram as intenções dele. Sabia que ele adorava ser o manipulador e que sentia um prazer sexual ouvindo gritos de dor. Para ele, o grotesco e o bizarro eram orgásticos

- Hoje finalmente você será minha, mas para isso eu preciso prepará-la. Trouxe um manto, uma coroa e perfume para deixá-la linda. Hoje iremos nos unir; seremos um quando essa noite terminar. Eu a escolhi entre todas para ser minha rainha, minha deusa, e por isso lhe darei um presente.

Ele vai até o armário embutido no fundo do aposento e saca do bolso uma chave, que usa para abrir o cadeado que prendia a corrente na porta do armário. Ele abre o armário e mostra a Tereza algo terrível: Mauro inconsciente, nu e imobilizado.
...
Eles se conheceram em uma noite muito fria, quando ele saiu para ajudar na distribuição de mantimentos e agasalhos e ela estava na porta do bordel atraindo clientes. Os olhares se cruzaram e o interesse era mútuo, mas Mauro sabia que ela era prostituta e que sua mãe jamais aprovaria tal coisa. Ele voltou àquele lugar algumas vezes só para vê-la até que por fim virou cliente de Fraulein Ulla. Ia todas as quintas-feiras ver Tereza e como os outros pagava por sua atenção, até que um certo dia ela passou a não cobrá-lo por sua companhia. Mauro dedicava seu tempo livre apenas para Tereza, dizendo que lhe tiraria daquele lugar e que queria se casar. Tereza, por sua vez, dizia que também amava Mauro, mas que só abandonaria sua vida de meretriz quando eles finalmente se casassem. De uma maneira única um completava o outro, pois Mauro tratava Tereza com muito respeito e dignidade ao que ela retribuía com o carinho, amor e atenção que ele jamais teve. Finalmente as crianças infelizes acharam quem as amasse.
Todas essas cenas passam em segundos na mente de Tereza enquanto ela olhava Mauro inerte nos braços do monstro. Ela imaginava como aquilo poderia ter acontecido, por que Mauro estaria ali, amordaçado, nu e inerte, se ele ainda estava vivo e se estava bem. Como aquele maldito havia pego a ela e seu amado? Então, Tereza começou a se lembrar de uma certa vez em que ela estava com Mauro e um dos clientes do bordel quis sua companhia. Ela se recusou, dizendo que estava de saída, mas o idiota não aceitou um não como resposta, agarrou Tereza e mordeu seu pescoço. Mauro tratou de defendê-la dando um soco no homem e lançando-o ao chão próximo ao bar. Com sangue nos lábios, o homem levantou-se e disse a Tereza que um dia ela seria dele, mas não seria hoje. Lembrou-se também que ele exalava o mesmo cheiro de colônia barata e mofo, tão peculiar àquela figura.

- O que você fez com ele, maldito??? Deixe-o em paz! Ele não lhe fez nada, estava apenas me defendendo.

- Eu a teria transformado em deusa naquela noite se não fosse esse miserável. Agora ele deve pagar.

Ele joga Mauro ao chão, vai até uma das mesas e pega um pequeno pedaço de algodão. Abaixa-se e aproxima o algodão nas narinas de Mauro, fazendo com que ele acorde. Mauro ainda estava muito perturbado quando ele o agarrou pelos cabelos e o colocou sentado. Depois se levantou, pegou um dos ganchos que balançavam no teto e atravessou num só golpe o ombro direito de Mauro, que urrou de dor. Pegou ainda um segundo gancho e repetiu a ação, dessa vez enterrando o vergalhão no ombro esquerdo da pobre figura. Ele se dirigiu até uma das prateleiras do quarto e começou a puxar uma corrente, que, passando por uma carretilha, ergueu Mauro pelos ombros até uma altura suficiente para deixá-lo dependurado. Mauro sentia dores infernais e chorava copiosamente por saber que nada poderia fazer para se salvar. Mauro pediu piedade, mas a figura obscena não lhe ouvia. Na verdade, sempre que ouvia Mauro implorar por clemência um sorriso sádico tomava sua face. Ele gostava daquilo, lhe dava prazer ser Deus. Ele foi até Tereza e a colocou próxima a Mauro, tão próxima que as gotas de sangue que caiam sujavam seu vestido.

- Este é meu presente para você minha deusa. Este é o cordeiro que sacrifico em sua homenagem. Que o sangue dele nos torne uno.

Munido de uma pequena faca ele se aproxima de Mauro e o olha nos olhos, como se pudesse ler sua alma. Mauro, corroído por um imenso ódio e sabendo de seu triste fim, cospe na face do ser bestial amaldiçoando-o. Ele sorri, segura os cabelos de Mauro e lentamente passa a faca no pescoço do homem ferido. Mauro tenta gritar, porém sua voz é abafada pelo líquido rubro e espesso que agora jorra abundante em Tereza. Mas, antes mesmo do pobre homem morrer afogado em seu próprio sangue, com destreza meticulosa abre as entranhas de Mauro, fazendo as víceras da pobre figura desabarem sobre Tereza. Ele se afasta para melhor apreciar seu trabalho e vê as últimas convulsões de Mauro. Tereza está em choque e sequer emite um gemido. Seus olhos estão estalados e seu corpo coberto com o sangue de seu amado. Em sua mente, Tereza tenta acordar daquele pesadelo. Contudo, vendo seu amado estripado bem a sua frente, sente um ímpeto diabólico invadir seu corpo. Dotada de uma frieza que somente os desesperançosos possuem, Tereza controla sua agonia e repara que a maldita figura ainda está apreciando o quadro grotesco. Assim, ela se dirige a ele num tom sutil e submisso, porém ainda muito assustado.

- Por favor, não me mate!

- Eu não vou matá-la, vou transformá-la em deusa. Esse sacrifício era necessário para purificar seu corpo com o sangue do cordeiro. Agora você está apta a participar da cerimônia.

- O que você quer de mim? O que devo fazer para me tornar deusa?

- Nós vamos nos unir, vamos nos tornar um único corpo, uma única alma. Vou vesti-la com um manto e lhe darei uma coroa. Depois lavarei seu corpo com água de cheiro e lhe cobrirei com pétalas de rosas. Ao final disso você me amará como seu Deus e será uma deusa.

Ele vai até Tereza munido da pequena faca que tirou a vida de Mauro, abaixa-se e corta as tiras de fita adesiva que prendiam os pés dela. Ela tem vontade de se levantar e reagir, mas sabe que isso não seria uma boa escolha e continua quieta e submissa àquela figura hedionda. Ele se posta atrás dela e corta as amarras que prendiam suas mãos, deixando Tereza totalmente livre. Uma vontade profunda de correr toma de súbito Tereza, mas ela consegue se controlar. Ao contrário do que seus instintos animais dizem, Tereza se mantém calma e levanta-se da cadeira. Ela chega perto dele e tenta tocar seu rosto, porém ele a segura pela mão.

- Não me toque!!! Você ainda é uma puta de esquina! Só depois de virar deusa você poderá me tocar.

- Então me possua logo! Una-se a mim agora mesmo e me torne deusa!

Tereza, acostumada a controlar situações que envolvam sexo e dor, vai aos poucos manipulando o miserável, fazendo com que ele permita que ela se mova livremente. Ela tira seu vestido e sapatos, ficando completamente nua em frente a ele. Aos poucos vai se aproximando de uma das prateleiras que guardam as ferramentas, abrindo os braços para abraçá-lo.

- Venha, me possua agora! Quero ser logo uma deusa e poder adorar meu Deus por completo. Venha, toque-me agora! Quero sentir seu corpo se fundir ao meu.

Tereza sabe que o orgulho é a fraqueza daquele ser. Ele gosta de ser Deus, isso o satisfaz, e assim ela o tratará. Ele se aproxima dela e começa a tocá-la, espalhando ainda mais o sangue de Mauro sobre o corpo nu de Tereza. Ela permite que ele morda seu pescoço e seu ombro enquanto se concentra para alcançar uma das chaves que está na prateleira próxima aos dois. Ele se sente intocável, onipotente, quando se abaixa para morder os seios de Tereza. Porém, de um modo muito rápido, ela alcança a chave inglesa que está pendurada atrás de si e junta toda sua força num golpe, que acerta a cabeça do monstro, fazendo com que ele se afaste dela. Sem deixar que ele reaja, Tereza o acerta mais uma vez e ele desaba.
...
Ele desperta lentamente e sente uma forte dor de cabeça, sem saber exatamente onde está. Lembra-se que hoje é aniversário de sua mãe e de imediato imagina qual presente gostaria de comprar para ela. Ele tenta abrir os olhos e percebe que está numa sala muito escura e silenciosa. Sem anúncio uma porta se abre a sua frente e ele vê a figura de uma mulher.

- É você mamãe? Eu não esqueci de seu presente. Vou buscá-lo agora mesmo.

- Cale-se! Eu não sou sua mãe!

Ele se dá conta de onde está e se lembra do que aconteceu. Fica furioso ao perceber que estava atado à cadeira de madeira que antes prendia sua presa. Tenta se soltar, mas seu esforço é vão. E, sem dizer mais nada, ela se aproxima dele munida de uma tesoura de cortar latão, aproxima-se de seus pés e corta um de seus dedos. Ele grita de dor e de ódio e mais uma vez tenta se soltar em vão.

- Tire-me daqui! Liberte-me agora mesmo!!! Eu lhe ordeno!!!

- Cale-se! Agora você não é mais Deus. Agora você não é mais nada...

Ele percebe que perdeu o controle, percebe que não tem mais poder sobre ela. Percebe que não tem mais poder sequer sobre si mesmo. A sensação de impotência o torna fraco, fazendo com que ele comece a chorar como uma criança.

- Eu só queria ser amado e respeitado. Só queria que todos gostassem de mim. Eu só queria ser Deus! Por favor, Tereza, não me mate. Não me faça sofrer. Eu a amo como eu amava minha mãezinha.

- Silêncio! Eu não sou mais Tereza! Agora eu sou uma deusa e meu nome é Dor!